domingo, 6 de março de 2016

O Brasil do meu filho - Anna Ramalho

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Christiano, meu único filho, comemora neste domingo, 6, seus 39 anos. Nasceu em 1977 sob Geisel – o general que prometeu a abertura lenta, gradual e segura e cumpriu sua parte. Depois, de 1979 a 1985, viveu sob Figueiredo, o general que só pensava em cavalos,  pediu que o povo o esquecesse – prontamente todos atendemos ao seu pedido – mas pelo menos terminou de fazer o que seu antecessor prometera. Ainda menino, não creio que se lembre, voltou ao Brasil o exilado  Fernando Gabeira, na primeira grande festa da democracia.  Chris é fã do Gabeira e, apesar de não ser muito ligado em política, não deixa de votar a cada eleição.  O último general saiu e ele, ainda tão menino, viveu comigo o drama da agonia e morte de Tancredo e a incrível ascensão de Zé Sarney. Não sei se ele lembra,  tinha apenas 8 anos, mas nesse dia chorei muito.
Christiano, meu filho aniversariante
Christiano, meu filho aniversariante
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Em 1989, ele viu a mãe e o padrasto em lados opostos, o que era coisa rara. Meu querido Fernando era todo pelo xará Fernando Collor. Eu, quem diria hoje, fui de Lula. Convicta. O operário me emocionou e me convenceu. Chorei outra vez. Muito. No dia do fatídico debate entre os dois candidatos, das piores coisas que já testemunhei, dos golpes mais baixos que já presenciei. Chris ainda tinha 13 anos, estava mais preocupado com o surfe, as aulas de tênis e, em último lugar, com a vida escolar ( coisa pela qual ele nutria um sincero horror, para meu desespero). Lula e Collor não lhe interessavam a mínima.
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Quando ele tinha 15 anos, os caras-pintadas foram às ruas, o Brasil viveu momento semelhante ao que vivemos agora, mas estávamos ambos em momento muito doloroso: Fernando morria,  aos 42 anos, enquanto Collor lutava pela sobrevivência. Cada um morreu à sua maneira e nós dois, Chris e eu, só tínhamos lágrimas para o nosso Fernando. Foi um período difícil, de muita dor para nós e muita luta pela sobrevivência pra mim.
Itamar entrou com seu topete e, apesar da descrença generalizada, fez um grande governo e tirou o povo da UTI.  Quando  saiu, Chris estava às vésperas de completar 18 anos. No ano seguinte já votaria e tenho quase certeza de que votou em FHC, o presidente que nos tirou a todos do sufoco, que teve muitos defeitos também, mas ainda assim é o que temos de melhor na história recente do país.
Aos 18 anos, ele teve um encontro muito mais importante: conheceu e nunca mais largou da sua Carol, com quem está há 21 anos e, casado, há 14 anos. Foi sob Lula que se conheceram, enquanto o povo cantava esperançoso Lula lá.  Entrou água em toda aquela esperança. Deu no que deu.
Chris e Carol, o grande amor
Chris e Carol, o grande amor. Na barriga, Olívia ( Foto Cristina Lacerda)
Sobre Dilma, prefiro não comentar. Sobre os últimos acontecimentos, não preciso comentar.
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Chris e a filha mais velha, Antonia
Chris e a filha mais velha, Antonia
Meu filho querido, hoje a única coisa que peço a Deus é que passemos todos por todas essas vicissitudes como se fora uma purgação de pecados, queima de carma, sei lá.  Os brasileiros não merecem esse circo dos horrores – muito menos você, sua mulher, suas duas meninas tão lindas e amadas, Antonia e Olívia.    A primeira nascida sob Lula, 2003; a segunda, sob Dilma,  2015.
Chris e Olivia, a caçula
Chris e Olivia, a caçula
Mudar de país não é a solução. Somos brasileiros, aqui é o nosso país,  para o bem ou para o mal.  Apesar de muito descrente, torço e peço para que você, Carol e as garotas ainda possam viver num Brasil decente, passado a limpo, um país digno, do qual vocês se orgulhem. Infelizmente, e apesar de todo o meu otimismo, não acredito que viva pra ver esse dia chegar.
Hoje quero esquecer de tanta dor, de tanta baixaria. Vamos comemorar o seu aniversário com alegria e esperança.
No outro domingo, 13, quem sabe, o dia nasce feliz.

Por Anna Ramalho

http://www.annaramalho.com.br/news/cronica-da-semana/84691-o-brasil-do-meu-filho.html

Um comentário:

  1. Muito honrada, amigo Vicente Limongi, de estar aqui no seu portal com essa crônica q escrevi em homenagem ao meu filho. Você é um amigo inestimável. Beijos

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