sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Sarney, o presidente da democracia e da preocupação com a questão social

Por Said Barbosa Dib

Para a presidente da UBES - União Brasileira dos Estudantes Secundaristas -, Manuela Braga, em encontro com o presidente do Senado, José Sarney, a aprovação do Estatuto da Juventude com a federalização da meia-entrada seria quase tão importante quanto foi a legalização da UNE, em 1985, pelas mãos do próprio Sarney, à época presidente da República. O reconhecimento da líder estudantil com relação a Sarney é muito importante. Durante o início da década de oitenta a UNE – União Nacional dos Estudantes - reivindicou a Assembléia Nacional Constituinte, a revogação da Lei de Segurança Nacional, além da sua legalização enquanto entidade representativa dos estudantes universitários. Depois de participar de todos os comícios da campanha pelas ''Diretas Já'', a UNE apoiou, em 1984, a candidatura de Tancredo Neves para Presidente, por acreditar ser ele a representação da ampla frente que exigia o fim daqueles 20 anos de autoritarismo. Em 1985 o presidente José Sarney atende todas as reivindicações. Sanciona a lei que reconhece a UNE, novamente, como ''a entidade representativa do conjunto dos estudantes das instituições de ensino superior do país''. Além da UNE, imediatamente liberou a política partidária, com o ato simbólico de receber no Planalto Giocondo Dias e João Amazonas, dos dois partidos comunistas, e restabeleceu as eleições diretas nos antigos municípios de segurança nacional. Logo em seguida convocou a Assembléia Constituinte, algo que até mesmo Tancredo tinha temores em fazer. Sarney facilita, ainda, a construção da maior central sindical da América latina, a CUT. Os DCE's e CA's das faculdades passam a se reestruturar, engajando-se nas lutas por melhor ensino, mais democracia e etc.


Em 1989 ocorrem as primeiras eleições presidenciais no Brasil pós-ditadura. Portanto, coube a José Sarney assumir o comando da redemocratização. As circunstâncias, seu temperamento conciliador e sua formação democrática o conduziram ao caminho da aceleração da abertura política. Experiente e sem ingenuidades perigosas, como os tempos exigiam, trabalhou com os militares, não contra eles, como lhes disse, profissionalizando as Forças Armadas e levando-as de volta aos quartéis. Nos cinco anos de seu governo solidificaram-se as instituições, evitando-se os revanchismos tanto da extrema esquerda quanto da extrema direita. As eleições se sucederam em absoluta tranqüilidade. A imprensa nunca foi tão livre. A sociedade encontrou o caminho de uma democracia que não se esgota na eleição de seus representantes, mas se prolonga na consciência da cidadania. Pela primeira vez o brasileiro considerou-se cidadão, senhor de seus direitos, capaz de se manifestar e exigir. Algo que o Plano Cruzado, em grande parte, com ampla participação dos "fiscais do Sarney", ajudou a moldar.


Como conseqüência natural da política de abertura adotada por Sarney em relação às greves, por outro lado, o governo também se comportou de forma decisivamente liberal no que se refere ao reconhecimento de entidades sindicais. Até a promulgação da Constituição de 1988, não se pode esquecer, o ministro do Trabalho dispunha de poder discricionário em matéria de legislação sindical. Prevaleciam as antigas disposições da CLT relativas a esta matéria, especialmente aquelas constantes do Título V. Competia ao ministro, com exclusividade, determinar a expedição ou não de carta de reconhecimento sindical à associação profissional que entendesse merecedora da distinção, colhendo antes o parecer da Comissão de Enquadramento Sindical e, eventualmente, dos órgãos de informação. Pois foi o governo do presidente Sarney, não obstante institucionalmente preso à legislação celetista, que liberou o deferimento dos pedidos, de tal maneira que, entre março de 1985 e setembro de 1988, às vésperas da entrada em vigor da nova Constituição, haviam sido reconhecidas 2.269 entidades, das quais 823 representantes de segmentos profissionais ou econômicos urbanos e 446 rurais. No mesmo período foram concedidos, como exigia a legislação, 335 extensões de bases territoriais urbanas, abrangendo 2.235 municípios. Atendendo a reivindicações feitas pelos trabalhadores, em 4 de agosto de 1988 baixou o decreto nº 96.469, reconhecendo a Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos. Neste cenário de liberdade para a reorganização dos trabalhadores, aconteceu, com plena liberdade, o 2° Congresso Nacional da CUT, realizado nos dias 31 de julho, 1, 2 e 3 de agosto de 1986, no Maracanãzinho, Rio de Janeiro, RJ. Participaram 5564 delegados de 1.014 entidades sindicais.

A CUT firmou-se como referência para a classe trabalhadora. Tem início sua consolidação nacional. Os delegados começam a discutir mudanças no Estatuto a partir das experiências acumuladas. Aprovam a estrutura vertical da CUT, criando os departamentos profissionais, ou seja, por ramo de atividade, o que trouxe à Central novas questões, como o sistema de contratação coletiva e seus reflexos na própria estrutura corporativa. A partir desse Congresso estruturam-se os departamentos nacionais dos bancários, metalúrgicos, petroleiros, químicos e de educação, construindo-se articulações de comissões provisórias em diversos outros segmentos: vestuário, urbanitários, construção civil, transportes. O contrato coletivo de trabalho passa a ser o ponto central dos debates sobre a democratização das relações trabalhistas. Portanto, diferente das atuais tentativas de abolição das conquistas históricas dos trabalhadores, Sarney procurou reforçá-las, como foi o caso tanto da Juntas de Conciliação quanto a decisão política de Sarney em universalizar a cobertura do INPS (atual INSS). Quanto a este tema, Sarney tinha a preocupação em proteger não apenas os trabalhadores que possuíam uma boa base organizacional e uma grande capacidade de mobilização. Para estes, bastava o fato do Presidente não tratar suas greves e manifestações com arbítrio e repressão; e de garantir mecanismos institucionais que preservassem seus salários, como os reajustes periódicos que acompanhavam o índice inflacionário. O presidente se preocupava, principalmente, com aqueles setores marginalizados que nem no mercado de trabalho estavam e que, durante o regime militar, foram os que mais sofreram, mesmo durante o chamado “milagre”. Para se entender melhor esta questão, nunca é demais lembrar que, antes de 1985, quem não estivesse no INPS (hoje, INSS) não tinha direito a nada. Sarney criou a universalização da saúde, a proteção do homem do campo, pescadores, deficientes e todos aquelas categorias que não eram assistidas pelos mecanismos sociais do Estado. Criou, ainda, o direito à impenhorabilidade da casa própria, o bem da família, inovando no que seria também incorporado à Constituição: a preocupação em destacar que a propriedade deve ter um fim social e que se deve ter um limite existencial para a família diante dos credores. Estendeu aos pobres, ainda, o direito à cidadania, pois foi no seu governo que os analfabetos conquistaram o direito de voto. Era o “Tudo pelo Social” colocado efetivamente em prática. É isso!

Said Barbosa Dib é historiador, analista político e, com muito orgulho, assessor de imprensa do senador Sarney

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