quarta-feira, 30 de outubro de 2019

Minha Manaus preferida

*Robério Braga
Por reconhecer que há várias cidades encravadas nesta Manaus milenar que ousa festejar os 350 anos da presença europeia, resolvi proclamar aquela que escolhi como a minha preferida, tomando o olhar a partir do porto flutuante em direção ao Teatro Amazonas, o templo emblemático que bem caracteriza a terra dos manaó.

A escolhida não tem mais os sons dos pássaros encantados, nem sob as janelas dos casarões se consegue ouvir o bom francês nas conversas de hora de almoço, muito menos o cantarolar dos italianos fraternos carregando os pianos pelas calçadas ou o tilintar dos bondes nos trilhos ingleses ou norte-americanos. Esta cidade está contida na lembrança dos mais antigos e nas crônicas dos que a redescobrem na leitura dos jornais que sobraram nas coleções do Instituto Geográfico e Histórico e da Biblioteca Pública, nos livros dos cronistas e historiadores.

A Manaus na qual adoro passear, entre horas vagas e no afã do trabalho, vem carregada de jovens despojados de padrões de vestimenta, os que estão sempre bem à vontade, cheios de esperança e alegria vivendo o presente, mas preparando o futuro como nunca se viu antes, nem nos tempos áureos da belle époque.

É possível fazer esta afirmação porque naquele tempo, muito embora tenham havido muitas experimentações artísticas, clubes, grêmios, associações de arte, academias e universidade, não foi para as artes o maior empenho e o interesse principal da juventude, embora praticassem teatro, música e dança, mas o faziam como lazer e entretenimento, como se fosse mostra de erudição, bem própria daqueles anos.

Cabelos ao vento, rebeldes ou não, são muitos e contam-se algumas centenas, os quase meninos e meninas de agora que caminham levando consigo os violinos, violões, cavaquinhos, bandolins, oboés, trompetes, violas... e muitos outros instrumentos com os quais concretizam o sonho imenso da busca pela realização acadêmica e profissional. Outros tantos á alcançaram este patamar e se mostram mais do que satisfeitos.

Bem sei que não faz muito que tudo isso começou (ou melhor, recomeçou, porque muitas vezes temos vivido de recomeços), mas o que desejo e confio de verdade que há de ser, é que, desta vez, não iremos amargar a bendita frase tão comum entre os mais antigos: “Manaus, a terra do já teve”.

O que vejo pelas ruas brotou com o empenho que tive o privilégio de tocar ao lado de inúmeros entusiastas em recente e longa função pública na gestão da política de cultura. O que ouço nos saraus da Academia de Letras, acompanho nas notícias de imprensa e de redes sociais, identifico nas escolas infantis que anunciam aulas de arte complementando o ensino tradicional, o que divulgam os editais das universidades públicas e privadas abertas a esta missão... o que reconheço nesse cenário é um novo tempo de bonança e progresso.

Essa cidade tem outros ares, outros sons, outra vida quando olhada sob o ângulo dessa juventude que tem oportunidades com as artes, e o que desejo, ardentemente, é que esse fogo não se apague, que todos possamos continuar compreendendo o valor das artes para a formação dos jovens, o prazer dos adultos, a felicidade dos mais idosos.

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