terça-feira, 30 de abril de 2019

Zona Franca do Brasil

Robério Braga

Espero que o leitor não estranhe o título do artigo, nem a minha intromissão em coisas correntes visto que está acostumado a ler sobre assuntos do arco da velha aos quais costumo dedicar as linhas dominicais. É que a questão de fundo é recorrente, tem viés histórico e sobre a qual não consegui deixar de dar o meu pitaco.

Corria o ano de 1995 e como vereador fui convidado a exercer o cargo de secretário de Estado de Comunicação Social. Nesta condição, diante da visita do presidente da República e procurando sensibilizá-lo para a defesa do nosso polo industrial, aliado à empresa de comunicação que trabalhava para a secretaria projetamos e realizamos campanha publicitária ampla, explicando, tintim por tintim, tudo sobre a zona franca. E o fizemos sob o dígito de ZONA FRANCA DO BRASIL.

Não se tratava de uma frase vazia, puramente marqueteira, mas da síntese da representatividade da Zona Franca sediada em Manaus. O que ela representava para a economia nacional, para o desenvolvimento, defesa e ocupação da Amazônia Brasileira, para a redução das desigualdades regionais, para a preservação da floresta, enfim, o que era o bem-sucedido modelo de desenvolvimento encravado em região tropical por demais cobiçada. O que demonstramos, com a habilidade de redator profissional, e ainda cabe atualmente, foi que se tratava de um bem nacional, que contribuía para economia do País e defendia o relevante patrimônio ambiental brasileiro que se insere na Região Amazônica.

Sabe-se que a proposta original, de 1957, do deputado Francisco Pereira da Silva, tinha outro viés, importante naquele cenário. O decreto aprovado pelo presidente Castelo Branco, com a compreensão da necessidade da ocupação e do desenvolvimento da região, ajustou a primeira proposta e concedeu ao Brasil, por meio da chamada Zona Franca de Manaus, o direito de integração econômica e social da Região Amazônica ao País, com ação industrial, comercial e agropecuária, das quais somente a industrial vem resistindo heroicamente.

Creio que deva ser necessário, mais uma vez, demonstrarmos, o mais amplamente possível, que trata-se de um mecanismo brasileiro para uma parte do Brasil, ainda que não seja possível desconhecer que somos brasileiros por opção, posto que desde 1821 porque fomos às Cortes Portuguesas com representação política independente passamos a sofrer revezes os mais diversos que procuram objetar o nosso desenvolvimento e a independência econômica. De lá para cá tem sido uma luta só.

Nem o fato de termos jurado a Constituição do Império do Brasil em 1823 e abandonado a relação com as Cortes Portuguesas, nem o levante de 1831, as contínuas batalhas pela autonomia política finalmente conquistada em 1850 e somente implementada em 1852, a adesão a República, a sobrevivência à “república da espada” e aos conflitos de Eduardo Ribeiro e Thaumaturgo de Azevedo, o enfrentamento aos movimentos de 1913, 1924 e a revolução de 1930, nada disso nos livrou de novas pelejas.

No caso da zona franca nem mesmo a sua constitucionalização em 1988, por ação firme e decidida de Bernardo Cabral, nem as seguidas prorrogações de prazo e decisões do Supremo

Tribunal Federal a favor de sua perenidade e intocabilidade, nada disso tem sido suficiente para impedir que, de tempos em tempos, conforme o plantonista da vez em órgãos do Governo Federal, alguém resolva investir contra a nossa sobrevida industrial.

A última dessas tentativas não só foi estranha e inesperada, mas, tendo sido tomada por impulso, exprimiu o propósito verdadeiro do autor, aquele que os políticos habilidosos costumam esconder por debaixo do pano. Afinal, mais uma vez o Brasil teima em não se reconhecer como um país amazônico, embora sejamos a maior parte do território pátrio e guardiões de riquezas nacionais incomensuráveis.

Até quando seremos enjeitados como brasileiros? Não importa, ficaremos fiéis à nossa nacionalidade e às nossas origens e tradições. Resistiremos: afinal, resistir é nossa sina.
Transcrito de A Crítica

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