quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Bernardo Cabral: Palestra inaugural na solenidade de abertura das atividades do Superior Tribunal de Justiça

Foto: Bernardo Cabral com o competente advogado Alexandre Fabre

Presidente: Ministro FÉLIX FISCHER
Palestrante: J. Bernardo Cabral

Data: 16 de outubro de 2013, às 16 horas
Local: Sala de Sessões do Plenário da Corte
Brasília - DF

O PRONUNCIAMENTO:

“Presidente FÉLIX FISCHER – Senhores Ministros
Autoridades:
Minhas Senhoras, Meus Senhores

Desnecessário iniciar estas palavras registrando a imensa satisfação de me encontrar neste Plenário a convite do ilustre Presidente, Ministro FÉLIX FISCHER –  a quem dedico especial amizade desde a sua brilhante exposição na Comissão de Constituição e Justiça no Senado Federal – a fim de “ministrar a palestra inaugural na solenidade de abertura das atividades, a realizar-se no dia 16 de outubro, às 16 horas”, conforme atencioso Convite a mim dirigido no dia 23 de setembro de 2013 e, de imediato, aceito.
Antes de dar sequência a minha manifestação, permitam-me, porque julgo adequado, relembrar um acontecimento que tem inteira ligação entre mim e este Tribunal, embora possa parecer  um acaso ou uma coincidência.
Com a edição do Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968 – de triste memória – o Presidente da República era investido no poder de suspender os direitos políticos de qualquer cidadão pelo prazo de 10 anos e cassar mandatos eletivos federais, estaduais e municipais e de pronto, no seu artigo 11, esse Ato nº 5, impunha a maior aberração contra o Poder Judiciário. Passo à sua leitura, na integra:
Art. 11.  Excluem-se de qualquer apreciação judicial todos os atos praticados de acordo com este Ato Institucional e seus Atos complementares, bem como os respectivos efeitos.
Com a decretação do recesso do Congresso Nacional, muitos viajaram para os seus Estados de origem, enquanto outros para o Rio de Janeiro. O meu caso.
Acontece que a suspensão de direitos políticos e a cassação de mandatos de deputados federais e senadores continuaram a ocorrer, a partir do mês de dezembro de 1968. Na relação de fevereiro de 1969, ali estava o meu nome, com a cassação do meu mandato de deputado federal e a suspensão dos meus direitos políticos por 10 anos. Faço um parênteses: - punição injusta que cumpri, por inteiro, uma vez que não cheguei a ser anistiado, porque a Anistia só veio tempo depois.
Retomo o tema. Àquela altura, com a existência do Estatuto do Cassado – autoria do governo militar instalado a partir de 1964 – os punidos com os atos de exceção não podiam ausentar-se do local onde se encontravam,  por ocasião da edição do ato punitivo.
Passei a residir no Rio de Janeiro, sem poder ter conta em Bancos oficiais, participar de concurso público, ter Carteira de Identidade ou Passaporte, e, pior de tudo: - não poder visitar minha Mãe que se encontrava em Manaus, Amazonas (Estado de onde sou natural e ao qual representava na Câmara dos Deputados).
Portanto, só me restava continuar como Advogado (Turma de 1954, Faculdade de Direito do Amazonas), inscrito que era na OAB – AM, desde 1955.
Com inscrição secundária na OAB-RJ, passei a exercer a profissão nos auditórios forenses da cidade. E foi exatamente a partir daí, que frenquentava, profissionalmente, as Varas Federais do Rio de Janeiro, e, em uma delas, dois conterrâneos: Silvério Cabral e Ariosto de Rezende Rocha, meu Professor na Faculdade de Direito do Amazonas, onde tinha conquistado, por concurso público de provas e títulos, a Cátedra de Ciência das Finanças.
Nessa altura, relembro o acontecimento que lhes falei ao início desta apresentação e que possa parecer um acaso ou uma coincidência: - o meu relacionamento com o então Juiz Federal Evandro Gueiros Leite, que se transformou em amizade altamente respeitosa e, sem que fosse possível imaginar, mais tarde ele Ministro Presidente do Tribunal Federal de Recursos e eu Relator da Comissão de Sistematização.
Aquele passado permitiu o entrosamento  com a Assembleia Nacional Constituinte, cuja Comissão era integrada pelos Ministros Antonio de Pádua Ribeiro (Presidente), Cid Fláquer Scartezini, Carlos Thibau, Nilson Naves, Eduardo Ribeiro e Ilmar Galvão.
Por volta de junho de 1987, o Presidente Evandro Gueiros Leite, criava a Comissão encarregada de apresentar estudos, sugestões e acompanhar os trabalhos da Constituinte, na parte atinente ao Poder Judiciário, em particular no tocante “às alterações que dissessem respeito ao Tribunal Federal de Recursos e Justiça Federal”.
Vale trazer à  colação que antes, em maio de 1987, na Subcomissão do Poder Judiciário e do Ministério Público da qual era Relator o Deputado Plínio de Arruda Sampaio, tramitava a Proposta para a transformação do Tribunal Federal de Recursos e a instituição de Tribunais Federais de 2º grau, proposta essa que foi acolhida.
Encerrada essa fase, a matéria passou para a Comissão Temática denominada “Comissão de Organização dos Poderes e Sistema de Governo”, da qual era Relator o deputado Egídio Ferreira Lima, que no seu Parecer e Substitutivo sugeriu a criação do Superior Tribunal de Justiça, indicando nas Disposições Transitórias, art. 122, o seguinte.
Art. 122 – A composição inicial do Superior Tribunal de Justiça far-se-á:
      1. pelo aproveitamento dos Ministros do Tribunal Federal de Recursos:
      2. pela nomeação dos Ministros que sejam necessárias para completar o número estabelecido na lei complementar, na forma determinada nesta Constituição.
Com a publicação desse Substitutivo, passou ele a ser o texto base para a estrutura do Poder Judiciário, após receber o aperfeiçoamento que era necessário.
A partir daí, ao receber os demais trabalhos das Comissões Temáticas, procurei consolidar os textos que eram os mais diversos – alguns até com superposições – fazendo publicar o primeiro Anteprojeto da Constituição, nos meados de junho de 1987. A ele foram oferecidas muitas Emendas, das quais, referentes ao Poder Judiciário, aprovei mais de 50% e as fiz incluir no meu 2º Anteprojeto.
No final de 1987, as emendas apresentadas pela Comissão deste Tribunal foram, na sua maioria, por mim aprovadas, valendo destacar a da criação do “Juizado de Pequenas Causas” e a da supressão do Conselho Nacional de Justiça.
A realidade dos fatos é que a Comissão da Constituinte, oriunda deste Tribunal, à  frente o Ministro Antonio de Pádua Ribeiro, foi incansável na apresentação e na defesa de um imenso número de Emendas ao longo dos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte, das quais muitas disposições que se encontram no texto da Constituição de 1988 decorreram de sua aprovação. Destaco, por essa razão, os seus artigos 104 e 105, seus incisos, parágrafos e alíneas, que tratam da composição e competência desta Egrégia Corte, a apontar caminhos e indicar soluções para os que a ela recorrem.
Nesse passo, devo colocar em relevo apenas como verdade histórica ilustrativa – e não como auto elogio – que procurei dar a minha máxima compreensão e aprovação aos pleitos sempre institucionais – e jamais postulados por qualquer Ministro, em proveito pessoal.
Merecem registro dentre outros Constituintes os que sempre estiveram comigo, pessoalmente, para aprovar as suas emendas, referentes ao Judiciário; Konder Reis, Adolfo Oliveira, José Fogaça, Maurício Corrêa, Michel Temer, Nelson Jobim, José Costa, Nilson Gibson, Expedito Machado, José  Ignácio Ferreira, Joaquim Beviláqua, Sigmaringa Seixas, José Jorge, Mário Lima e Plínio de Arruda Sampaio.
- Eminentes Ministros que compõem este Tribunal, em exercício, e os que o compuseram anteriormente;
- Eminentes Ministros dos demais Tribunais Superiores;
- Eminentes Colegas Advogados, Senhores Desembargadores e Juízes do 1º Grau;
- Membros do Ministério Público;
- Minhas Senhoras, Meus Senhores.
Eminente Presidente FÉLIX FISCHER, dileto Amigo sempre presente:
Acerco-me do final desta minha palestra com a certeza de que relembrando os trabalhos desenvolvidos para a criação deste Tribunal, me conferem eles o prazer de dizer que carrego comigo as cicatrizes orgulhosas do dever cumprido – como me ensinou o meu saudoso pai – e com elas posso afirmar que, se a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é a Carta da Democracia, este Superior Tribunal de Justiça é a Egrégia Corte da Cidadania.”


J. Bernardo Cabral foi Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (1981/1983), Relator-Geral da Assembleia Nacional Constituinte (1987/1988), Ministro de Estado da Justiça (15.03.90 a 09.10.90). Foi ainda Senador, Presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal 1997/1998 e 2001/2002). Consultor da Presidência da Confederação Nacional do Comércio (desde fevereiro de 2003). Doutor Honoris Causa da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UNIRIO (20.05.2005). Doutor Honoris Causa da Universidade Federal do Amazonas – UFAM – (março/2009). Membro Efetivo da Academia Internacional de Direito e Economia (maio/2010). Doutor Honoris Causa da Academia Brasileira de Filosofia (março/2012). Membro da Academia Carioca de Letras (julho 2013).

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