terça-feira, 24 de agosto de 2021

Uma história de respeito, agradecimento e gratidão

Em 1965, Lindon Johnson assumia a presidência dos Estados Unidos. O cantor Nat King Cole morria, na Califórnia. Os Beatles eram homenageados pela Rainha Elizabeth. Roberto Carlos começa a fazer sucesso. Há ano, os militares tinham tomado o poder no Brasil, tirando do poder João Goulart. O MDB e a Arena eram os novos partidos brasileiros. As primeiras tropas americanas chegavam ao Vietnã. Eu, aluno do Colégio Dom Bosco, tinha 15 anos e chagava a hora de trabalhar.

Um belo dia, foi visitar minha casa um fotógrafo já bem conhecido, da revista O Cruzeiro. Casado com uma prima minha em segundo grau, a Adolfina. Fiquei encantado com as câmaras do visitante, especialmente uma Leica da qual nunca se separava. Seu nome? Roberto Stuckert.

Ele então sugeriu a meu pai Antônio e minha mãe Conchita que eu passasse a acompanhá-lo nas reportagens. Conseguiu-me um emprego de contínuo na sucursal do jornal Última Hora, em Brasília. E por lá fiquei três ou quatro meses servindo cafezinho para os grandes nomes da redação, Flávio Tavares, Danton Jobim, Samuel Wainer etc. Apaixonado por aquele novo mundo que estava à minha frente, fui transferido de função. Passei a revelar os filmes do fotógrafo da UH, o Severino Lima.

O Roberto Stuckert sempre me orientando o que era fotografia, luz, ângulo, teleobjetivas, tipos de filme. E sobretudo me indicando os caminhos da vida. Naquela mesma época Roberto levou-me para acompanhá-lo num jogo de futebol. Queria que eu aprimorasse a habilidade com a câmara em eventos esportivos. E lá fui eu para um Santos versus Seleção de Brasília. Pela primeira vez eu fotografava um rei, o Pelé. Ele, além de fazer uma foto minha com o craque, pendurou-me no meu pescoço, a tal Leica pela qual tanto me afeiçoei.

Outro belo dia, o presidente de então, o marechal Castello Branco, foi visitar o arcebispo de Brasília, Dom José Newton. Na ausência do Severino, o chefe de reportagem não viu outra maneira de obter fotos daquele encontro a não ser mandar “aquele menino” tirar o retrato da tal visita. “Aquele menino” foi está aqui até hoje. Passei assim, a conviver na cobertura diária dos fatos  com os grandes nomes da fotografia da época. Jáder Neves, Jean Manzon, Gervásio Batista, Jankiel Gonckzawoska e o próprio Roberto Stuckert. Mostrou-me quem era Bresson, Dorothea Lange, Arnold Newman. Evandro Teixeira, Walter Firmo, Claus Meyer, Claudia Andujar, Erno Schneider, para citar somente alguns nomes que me fez conhecer.

Pois bem, no dia em que recebi meu primeiro salário como fotógrafo, o Roberto Stuckert chamou-me e colocou novamente no meu pescoço aquela Leica. E disse-me: É sua. Mas não vou dá-la de presente. Você vai me pagar por ela. Para aprender a dar valor às suas conquistas. Mas há uma condição. Só poderá vendê-la para mim.

O tempo passou. Viajamos esse Brasil e o mundão de Deus em incontáveis coberturas, das mais variadas situações. Os filhos de Roberto e Adolfina nasceram. Eu, já fotógrafo digamos consolidado na profissão, pude devolver a eles um pouco do muito que aprendi com seu pai no mesmo front da notícia.

Ah, e aquela Leica que tanto me fascinou e que Roberto Stuckert teve a grandeza de me “vender” está comigo até hoje.

Vá em paz, meu “pai”, amigo e irmão. Que a Providência tenha com você a mesma benevolência que você teve comigo. Gratidão eterna.

Orlando Brito

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