quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Sarney: uma história de transparência

Por Said Barbosa Dib*


O senador José Sarney (PMDB-AP) reassumiu a Presidência da República depois de 22 anos. Discreto, tranqüilo e sem as ilusões dos neófitos, cumpre sua missão constitucional, como presidente do Senado, diante da ausência, em território nacional, da presidente, do vice-presidente e do presidente da Câmara. Fica até sábado. Mas o interessante é a repercussão nas mídias. Repórteres, colunistas, blogueiros e coisas afins, todos muito imaginativos, logo abraçaram as especulações sobre o que ele faria no período, de como se comportaria ou de como se sentia ocupando posição em que já ocupara no passado. Perguntas tolas foram dirigidas a ele sobre o assunto, sempre respondidas com a maior paciência e bom humor. Teve texto tão surrealista e hilário na especulação que se poderia pensar que Sarney poderia fazer uma verdadeira revolução nos três dias de ausência de Dilma. Alguns até brincaram com o fato de um cartomante mineiro - ou coisa parecida – ter previsto sua segunda passagem pela Presidência. Poucos aproveitaram o fato para fazer jornalismo de verdade, relembrando os aspectos positivos e negativos do governo Sarney ou sua importância para a transição democrática e a modernização da máquina pública. Um assunto bom seria a transparência, tema preferido da imprensa para tentar estigmatizar Sarney nos últimos anos. Poderiam mostrar que foi na Presidência de Sarney (1985-1990) que se criou o Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (SIAFI), que acabou com a “conta movimento” do Banco do Brasil e instituiu a Comissão de Defesa dos Direitos do Cidadão, apelidada pela imprensa de Ouvidoria, para apurar denúncias contra o próprio governo. Quem se lembra do que era a conta movimento do Banco do Brasil? Era o instrumento mais poderoso e desagregador da política brasileira no Regime Militar. O Banco do Brasil tinha uma carteira que administrava recursos resultantes de emissões de papel-moeda e que se destinava a socorrer empresas de amigos do governo, inclusive da grande mídia. Era a “maquininha ´mágica` de fazer dinheiro, um dos fatores mais importantes que pesava sobre a inflação e que tornavam privados os recursos que deveriam ser públicos" (palavras de Sarney). Pois foi Sarney o primeiro presidente que teve coragem de acabar com esta aberração. Não existe, na História da República, gesto maior de moralização e transparência de recursos públicos do que este. Todo mundo que chegava à Presidência deixava a monstruosidade orçamentária continuar porque era altamente útil ao aliciamento político.  Mais até do que o AI5.  E isso nunca deu manchete de jornal. Jornalistas e colunistas manjados, associados aos grandes conglomerados do Sudeste, de quando em vez, procuram estigmatizar Sarney como símbolo do que seria “pouco transparente”. Fazem isso por pura vingança corporativa. Sabem que, quando colocam em questão os detalhes dos gastos do Senado, por exemplo, se utilizam ou do portal “Contas Abertas” para suas acusações, ou consultam diretamente os dados do próprio SIAFI – Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal. Criado por quem? Por Sarney. A contradição é: como podem considerar Sarney “pouco transparente” se os mecanismos de consulta do Orçamento só existem justamente por causa de decisões políticas corajosas de Sarney quando foi presidente da República? Por outro lado, Sarney aplicaria no Legislativo a revolução que havia iniciado na Presidência da República. A Casa da Federação, desde o final dos anos 70, era a de menor prestígio do Congresso Nacional. Durante a Ditadura Militar, a presença dos senadores biônicos desprestigiou a instituição. Mas o cenário mudou durante a década de 90, justamente por causa da decisão de Sarney de criar, com a ajuda do competente jornalista Fernando César Mesquita, a TV Senado, que passaria a ser referência para todas as demais TVs públicas que viriam. Com ela, a transmissão ao vivo das sessões plenárias e das reuniões das comissões abriu ao país uma realidade conhecida por poucos. No início, eram somente quinze horas no ar, transmitidas apenas para Brasília. Em maio de 1996, o sinal da TV Senado já estava em todo o Brasil pelo sistema de satélite digital. Antes de completar um ano, já transmitia sua programação durante vinte e quatro horas, inclusive nos finais de semana. Com a explosão de CPIs, os índices de audiência aumentaram e chegaram a superar o desempenho de diversas TVs comerciais. Chefe da Secretaria de Comunicação da época, o jornalista Fernando César Mesquita lembra: “divulgava-se menos de 1% dos fatos produzidos pelos senadores, quando não se omitia ou distorcia os fatos. Agora, eles seriam acompanhados passo a passo no Senado”. Alguns maus jornalistas especialistas na cobertura da Casa foram os que mais chiaram, pois perderam o monopólio na “tradução” do que ocorria. Quer dizer, perderam o poder de manipular opiniões. O povo começou a ver que os comentários dos colunistas e repórteres não eram bem verdades absolutas. Aquela realidade acusada pelo excelente Bob Fernandes, de que "cerca de 12 jornalistas conduzem a opinião pública a respeito da política nacional", começou a ruir. É verdade que alguns jornalistas ainda acreditam nisso e confundem o inquestionável poder da mídia com o seu poder individual, mascarando o que deveria ser opinião pública com a opinião publicada. É verdade, também, que colunistas medíocres, - mas influentes -, continuarão recebendo seus jabás. Mas é fato que a transparência da própria instituição evoluiu muito. E evoluiu justamente por causa daquele que sempre sofreu os maiores e mais vis ataques: José Sarney. Não perdoam o que ele fez pela transparência desde que entrou na política. Pois, mesmo antes de ser presidente, teve a mesma postura como governador, deputado e senador pelo Maranhão. Depois da Presidência, ainda se manteve politicamente decisivo na vida política nacional, como senador do Amapá por três mandatos consecutivos, presidente do Senado Federal por quatro vezes. São mais de 55 anos de vida pública sem uma mancha sequer, em cargos sempre eletivos, que deveria ser mais apreciada como modelo para as novas gerações.

* Said Barbosa Dib, historiador, analista político e assessor, com muito orgulho, do presidente Sarney

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